Justiça lança campanha de sensibilização sobre crianças em casas de acolhimento

Caline Galvão em 20 de Dezembro de 2016

A fim de alcançar novos padrinhos para crianças e adolescentes assistidos pelas casas de acolhimento, a Justiça da Infância e Juventude de Corumbá lançou a campanha “Crianças Invisíveis”. A ideia visa sensibilizar a população para se envolver mais afetivamente e conscientizar a comunidade em geral com relação à importância de sua participação na consecução do direito à convivência comunitária e familiar dessas crianças e adolescentes.

A Justiça já conta com o “Projeto Padrinho” há alguns anos, mas, por meio da nova campanha, busca mobilizar entidades religiosas, clubes de serviço e cidadãos individualmente para que participem efetivamente. Hoje, em Corumbá, há nove crianças, com idades entre 09 e 17 anos, que não têm contato nenhum com suas famílias. Há, ainda, situações de adolescentes que atingem a maioridade nos acolhimentos. Por mais que sejam encaminhados a uma profissão e possam arcar com uma moradia, faltará a eles um grupo familiar para “fazer as refeições de domingo”, por exemplo.

“O país passa hoje por dois dramas que parecem contraditórios: por um lado, é crescente o número de mulheres com dificuldades de gestar, por outro, a permanência em definitivo nos acolhimentos de grande parte das crianças e adolescentes com mais de quatro anos de idade”, afirmou o juiz Maurício Cleber Miglioranzi, titular da Vara da Infância e Juventude e idealizador da campanha “Crianças Invisíveis”. Segundo dados divulgados pelo Senado, apenas um em cada quatro pretendentes (25,63%) admite adotar crianças com quatro anos ou mais, enquanto apenas 4,1% dos que estão no cadastro do CNJ à espera de uma família têm menos de 4 anos.

A maior preocupação da Justiça é que com o passar dos anos essas pessoas não aprendam a construir laços. “Quando a criança e o adolescente permanecem muito tempo institucionalizados, muitas pessoas acham que eles estão bem, já que é um abrigo, um lugar adequado. Ocorre que essas crianças acabam encontrando uma dificuldade de estabelecer vínculos porque os cuidadores nada mais são do que profissionais que são revezados. É a criança que chora à noite por ter pesadelo e ela não sabe quem vai poder chamar para socorrê-la. Ela não tem a opção de dizer ‘mamãe, esse final de semana quero comer bata frita’. Toda essa falta de um olhar individualizado a gente procura suprir pelo Projeto Padrinho sem impor àquela pessoa que quer contribuir a responsabilidade de uma adoção”, explicou o juiz ao Diário Corumbaense.

Juiz afirma que acompanhamento afetivo melhora a autoestima e qualidade de vida de crianças abrigadas

Para o magistrado Maurício Cleber, um dos motivos para a falta de envolvimento da população com essas crianças é o medo de construir vínculos com elas. “Algumas pessoas acham triste ir ao abrigo, mas eu tenho uma visão bem diferente disso. Os acolhimentos são lugares onde você é muitíssimo bem recebido, como regra, porque as crianças têm uma demanda por um olhar participativo e por uma atenção que quando vou aos abrigos, eu me sinto efetivamente acalentado, abraçado por essas crianças. Acho que mais do que tempo, especialmente diante da tragédia que aconteceu com o avião da Chapecoense, nós sabemos que da vida não levamos nada dos bens materiais, e sim os bons momentos que vivemos”, destacou o juiz.

De acordo com ele, a troca de experiências entre os padrinhos e as crianças é muito benéfica para ambos os lados, mas, principalmente para esses menores de idade. “A troca que existe entre as crianças e as famílias que apadrinham é algo que é absolutamente gratificante”, afirmou o juiz. “Nós temos vários exemplos muito positivos desse tipo de contato. O que nos chama muito a atenção é o salto de qualidade em autoestima dessas crianças”, disse.

Como existem várias formas de apadrinhamento, o juiz exemplificou o caso de um rapaz de 15 anos que foi apadrinhado, de certa forma, pela maçonaria Farol do Norte, de Ladário. Ele ingressou na Ordem Demolay, passou a ter uma motivação a mais para estudar e conseguiu entrar no Instituto Federal de Tecnologia do Mato Grosso do Sul (IFMS). “Há padrinhos, por exemplo, como o pessoal da Marinha que apadrinha por um ano e vai embora, no outro ano a gente procurar encaixar outro padrinho. Mas tem casos em que o padrinho acaba se tornando pai adotivo. O que chamo a atenção das pessoas é essa relação de carinho e amor que existe que é impagável”, disse o juiz.

Os apadrinhamentos podem ser “Afetivo” (mediante visitação e contato com a criança), Financeiro (comprometimento de custeio de alguma atividade) ou Empresa/Prestador de Serviço (mediante oferta de serviço).  Para participar, basta entrar em contato com o Núcleo Psicossocial do Fórum (3907-5740) ou diretamente junto às casas de Acolhimento Adiles de Figueiredo (Corumbá) e Amparo da Juventude (Ladário), mediante agendamento.

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Diogenes Duarte

Jornalista - DRT 986/MS - Servidor do Poder Judiciário do MS - Membro do Grupo AFAGAS.