Amor contra a maré: cresce número de pais que optam por adotar crianças mais velhas

Há sete anos o bancário aposentado Carlos Alberto Marques de Oliveira, de 63 anos, e seu companheiro, o professor André Luiz de Souza, de 42, adotaram duas meninas negras, na época com 5 e 7 anos, e com cinco irmãos. O casal faz parte de um grupo que, remando contra a maré, vem aos poucos ajudando a mudar o quadro da adoção no Brasil, onde a preferência é por bebês brancos, saudáveis, sem deficiência e sem irmãos, fazendo emperrar uma fila onde há quase seis vezes mais candidatos a pais do que crianças à espera de adoção — são 35 mil casais para 6 mil pretendentes a uma nova família. Esta semana, o grupo foi engrossado pelos atores Bruno Gagliasso e Giovana Ewbank.

O casal famoso, pais de Titi, de 3 anos, resolveu encurtar o caminho adotando a menina na África, onde o processo durou apenas um ano. No caso das meninas Vanessa e Valesca, hoje com 12 e 14 anos, respectivamente, a adoção foi obtida no mesmo tempo. Mas Carlos reconhece que seu caso foi uma exceção.

— Quando nos candidatamos, não fizemos nenhuma imposição. Isso acelerou o processo — acredita o morador de Maricá.

A coordenadora das Varas de Infância, Juventude e Idoso da capital confirma a suspeita do pai adotivo. Segundo Raquel Chrispino, o que faz a fila de adoções emperrar é justamente o desencontro da expectativa da maioria dos candidatos a pais com a realidade das crianças aptas à adoção. Segundo ela, das cerca de 2 mil crianças que estão nos abrigos localizados no Estado do Rio, há pelo menos 300 com dificuldade de encontrar um lar por serem negras, terem mais de 8 anos de idade ou serem portadoras de HIV, possuir algum outro problema de saúde ou neurológico ou por pertencerem a grupos de irmãos.

— A cultura da adoção vem mudando aos poucos, com as pessoas optando cada vez mais pelo perfil concreto da criança brasileira. A adoção tardia, por exemplo, que já foi considerada a partir de 4 anos subiu para 8 e a interracial enfrenta cada vez menos barreira. E, nesse aspecto, o exemplo dado pelos famosos está ajudando a quebrar resistências — afirmou Raquel Chrispino.

Em grupos familiares, o principal desafio da Justiça é evitar a separação. Em casos como o da dupla Vanessa e Valesca, os outros três irmãos foram distribuídos por mais duas famílias, que se visitam e mantêm contato frequente.

— Eu já tinha essa vontade de adotar. E decidi. Eu tenho um irmão adotivo então fui criado com isso na cabeça. Estava no seminário, mas saí e decidi adotar o Victor mesmo solteiro. O dia que saiu a adoção foi mais feliz da minha vida. Ele tem 12 anos e tem um problema crônico renal. Tem que fazer diálise três vezes por semana. Mas, se Deus quiser, ano que vem ele ganha um rim novo e se cura — conta Bruno Dias, farmacêutico de 33 anos que adotou Bruno, de 12 anos, há um mês.

Na opinião da advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão de Adoção do Instituto Brasileiro do Direito da Família, outro fator que emperra a fila na adoção no Brasil é burocracia. Ela diz que o processo de retirada do poder da família biológica sobre a criança, primeiro passado para início do processo adotivo, deveria durar 120 dias, mas atinge até quatro anos.

— Com isso, o tempo vai passando e as crianças vão ficando mais velhas, atingindo uma idade difícil de ser adotada — afirma a advogada.

A coordenadora das Varas de Infância do Rio, Raquel Chrispino, diz que a dificuldade em acelerar este processo está na necessidade de assegurar o direito à defesa das famílias biológicas. Além disso, a reinserção familiar é priorizada pela Justiça, explica ela.

— Eu e meu marido conhecemos X. numa segunda-feira e a visitamos nos dois dias seguintes. Três dias depois, com uma permissão especial do juiz, a trouxemos para passar o Natal conosco. Pedimos a guarda e estamos com ela desde então. Ela se encaixou imediatamente. Firmamos uma família já no primeiro dia. Não termos feito restrição quanto a idade, sexo ou cor facilitou a adoção — conta Alaíde Pires, jornalista que está há dois anos em processo de adoção.

Fonte: Extra

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Diogenes Duarte

Jornalista - DRT 986/MS - Servidor do Poder Judiciário do MS - Membro do Grupo AFAGAS.